O homem de Neandertal (Homo neanderthalensis) é uma espécie irmã de Homo sapiens, com a qual o homem moderno conviveu.[1][2] Surgiu durante o Pleistoceno Médio na Europa e no Médio Oriente há cerca de 400 mil anos e extinguiu-se há 28 mil anos, na Península Ibérica.[3] As razões para a extinção dos neandertais ainda são debatidas, com diversas possíveis causas levantadas para este fenômeno. As teorias mais aceitas apontam para fatores demográficos como pequeno tamanho populacional e endocruzamento[4], cruzamento e assimilação por humanos modernos[5], mudanças climáticas[6][7][8], doenças e a combinação desses.[9]
O fóssil mais antigo possivelmente pertencente à espécie data de há 430 mil anos.[10] Evidências genéticas indicam que o último ancestral comum (LCA do inglês "Last common ancestor") entre H. neanderthalensis e H. sapiens viveu entre entre 550 e 765 mil anos atrás na África, e seria um representante de Homo heidelbergensis.[11][12][13] Ambas as espécies conviveram após à migração de H. sapiens para a Eurásia, com o primeiro encontro das duas espécies tendo ocorrido a cerca de 80 mil anos no oriente médio, onde hoje se encontra Israel.[14][15]
H. neandertalensis possui grandes porções de seu DNA similares às sequências dos humanos modernos. Além disso, o sequenciamento de DNA nuclear neandertal realizado desde 2006 e publicado a partir de 2010 mostrou um antigo “fluxo gênico” entre os homens neandertais e os homens modernos da Eurásia. Os humanos não africanos atuais têm entre 1,8 e 2,6% dos genes neandertais, adquiridos por hibridação há cerca de 50 mil anos, logo após sua saída da África, e mais de 30% do genoma neandertal sobrevive em toda a população atual em diferentes locais do nosso genoma.[16] Acredita-se também que uma pequena parte desses genes adquiridos por hibridização que estão amplamente presentes em humanos tenham sido selecionados na nossa espécie por trazerem vantagens adaptativas.[17]
Apesar da similaridade genética entre as duas espécies, e da ocorrência de hibridização entre elas, H. neanderthalensis e H. sapiens são espécies distintas que apresentavam diferenças morfológicas significativas.[18] Quando comparados com humanos modernos, os neandertais apresentavam corpos mais robustos com mais reservas de gordura[19] e maiores narizes para o aquecimento do ar[20], ambas características associadas a adaptação ao clima frio[20](a fixação dessas características, no entanto, poderia ter sido resultado de deriva genética[19]). A capacidade craniana de homens e mulheres neandertais era em média de 1600 cm3 e 1300 cm3 respectivamente[21][22], o que é consideravelmente maior do que a média de 1400 e 1200 cm3 de humanos modernos.[23] Além disso, o crânio de neandertais era mais alongado e o cérebro possuía lobos parietais[24][25] e um cerebelo menor[26], mas com regiões temporais, occipitais e orbitofrontais maiores.[27][28] Progressos relativos da arqueologia pré-histórica e da paleoantropologia, posteriores à década de 1960, descrevem-no como um ser de considerável cultura, mas eventualmente subestimada por alguns autores.[29]
A cultura material e tecnológica dos neandertais era sofisticada em vários aspectos. Os neandertais produziam artefatos de pedra-lascada pertencentes a cultura musteriense, por meio da técnica de levallois.[30] Além de ferramentas, também usavam o fogo[31], eram caçadores de topo[32] e já cuidariam dos doentes.[33][34][35] Há inclusive, quem neles reconheça capacidades estéticas e espirituais semelhantes às do homem atual, como as sugeridas por pingentes[36], pinturas[37][38][39], gravuras[40] e possíveis sepulturas.[41]
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